A filósofa e teórica política norte-americana e professora da Universidade da Califórnia Wendy Brown é uma das analistas mais refinadas do neoliberalismo. Neste livro, ela traça a ambição da extrema direita de substituir a ordem democrática pela disciplina dos mercados e a solidariedade democrática pela moralidade sectária, racista e tecnocrata. Nesse quadro, a família ressurge como núcleo moral e econômico fundamental ao projeto neoconservador e ultracapitalista. Apanhada de surpresa pela sua própria força, a extrema direita subiu ao poder em democracias liberais pelo mundo. Cada eleição é um novo choque: neonazistas no parlamento alemão, neofascistas no italiano, o Brexit celebrado pelos tabloides xenófobos, a ascensão do nacionalismobranco na Escandinávia, regimes autoritários tomando forma na Turquia e Leste Europeu e, é claro, o trumpismo. O ódio belicoso racista, anti-islâmico e antissemita cresce nas ruas e na Internet; grupos de extrema direita eclodem na política após anos se escondendo. Vitórias políticas encorajam movimentos de extrema direita e adquirem sofisticação como manipuladores políticos e peritos em construir notícias nas mídias sociais.O livro de Wendy Brown narra a história dessa nossa atualidade. Desde a metade do século XX, ficou claro que os efeitos desagregadores da sociedade capitalista produzem o efeito conhecido como sociedade de massa: indivíduos perdem vínculos com local de origem e cultura, famílias se dispersam, "valores familiares" perdem sentido. Após a Segunda Guerra, na reconstrução alemã, um primeiro grupo de pensadores neoliberais - os Ordoliberais alemães - chama esse processo de "proletarização" - aceitando grande parte do relato histórico de Marx, embora se opondo aos seusvalores e esperanças políticas. Eles viam o capitalismo gerando uma força social massificada que poderia se revoltar contra ele com um retorno ao fascismo.O projeto neoliberal dos ordoliberais visava combater a proletarização: incentivar o empreendedor e a formação de empresas e revitalizar as províncias combatendo as grandes aglomerações urbanas. Ao mesmo tempo, era preciso reagrupar os indivíduos em suas famílias e torná-las responsáveis pelo autoprovisionamento e eventualmente transformando-as em unidades produtivas empreendedoras. "Ancorados na comunidade e na família", diz Wendy Brown, os indivíduos seriam capazes de resistir ao que Röpke e Rüstow chamaram de "fria sociedade" do mero valor econômico e da competitividade. Essa âncora c