No que diz respeito ao sofrimento existencial em suas mais diversas formas de constituição, há sempre uma tendência em nosso tempo de partir de um paradigma médico de consideração. Fenômenos como a depressão, a ansiedade, a compulsão e o suicídio sãomuitas vezes compreendidos hoje como distúrbios oriundos de uma alteração da composição químico-física de nossos corpos e como disfunções presentes no modo de estruturação cerebral. Justamente uma tal posição faz com que se tenha um crescimento cadavez maior das intervenções farmacológicas e uma intensificação igualmente vertiginosa do uso de medicamentos psiquiátricos. Há, contudo, nesses fenômenos mesmos algo que sempre escapa de uma tal abordagem e que se revela nos índices cada vez mais alarmantes de sua presença no âmbito populacional. Jamais se pode abstrair o sofrimento da vida daquele que sofre e não se pode nunca pensar a vida daquele que sofre em uma desarticulação com o campo histórico efetivo. Justamente isso está em jogo no importante livro que a Editora Via Verita agora publica: Suicídio: ditos e interditos. Com uma dedicação exaustiva, os diversos autores do livro se dedicam a reconstruir as faces múltiplas em jogo no acontecimento do suicídio: a relação entre suicídioe sobrecarga, a muitas vezes enigmática ausência de uma logicidade interna no ato suicida, o problema da culpa, sempre acentuado pelo discurso de que o suicídio vem acompanhado constantemente de indícios, a dificuldade de lidar com suicidas em âmbito familiar, entre muitos outros aspectos.