- Calma, afoita leitora! Como estamos cruzando a áspera, inabitada e gélida estepeda verdade, é preciso muito cuidado para vermos onde pomos nossos borzeguins.- Como posso me acalmar? O que me diz o doutor é um petardo capaz de fazerexplodir os alicerces da nossa excelsa Academia Brasileira de Letras!- Criada pelo Machadinho!- Sim. Isso a Nação, imortalmente grata, deve a ele.[...]Três graus e sete décimos a mais em todas as horas de todos os dias de muitosanos tornar-me-ão mais longo, e confortável, o embate com o maior de todos osmales, que é a desvairada insania brasiliensis.- E o rei, o que disse?- Pediu-me notícia da nossa específica loucura nacional.- Temos então uma loucura própria?- Tratarei disso no seguinte capítulo.Literatura, o que é?Entre nossos grandes estilistas, Machado de Assis e Guimarães Rosa são as maiores vítimas de emulação ou simples imitação. E quanta página morta em tais "homenagens", em geral oriundas de candidatos a ficcionistas, alunos aplicados ou professores sisudos. Lourenço Cazarré, ao contrário de falsear estilos, com muito humor e sarcasmo prefere respirar, e tem fôlego de sobra para isso, ao lado de alguns desses monstros sagrados. O que é literatura? Cazarré responde. De início, com o conto "Um vate de incomensurável acuidade e furor", e é a presença de Graciliano Ramos que dá o exato tempero a uma cômica e irônica resposta - de modo algum a única obra-prima deste livro. No segundo conto, "O último trem da infância", é o poeta Joaquim Cardozo o motivo de outra resposta. Os três contos seguintes, embora entre si tão diferentes, respondem cada qual a seu modo à minha indagação inicial. Já o último, "Breve memória de Simeão Boa Morte", outra impagável obra-prima, como novela burlesca atinge os cimos machadianos, uma imensa resposta, e à altura desses mesmos cimos. Ainda arrisco dizer que essa última história até o próprio Machado, gaiatamente, assinaria.André Seffrin