Leandro Pimentel costumava ser fotógrafo. Ainda é. Mas, depois deste O inventário como tática, será também conhecido como pensador arguto e original da fotografia contemporânea. Arguto porque soube identificar, na infinidade das imagens que hoje se produzem, um gesto decisivo que marca as obras fotográficas mais instigantes da atualidade. Original porque encontrou aí, nos inventários mais reiterativos, um signo de liberdade, um desafio à mercadoria, a proposição de um saber comum e a radicalidade de uma ação política.Fotografar foi desde sempre colecionar fragmentos de mundos. Turistas colecionavam viagens, famílias colecionavam momentos, fãs colecionavam celebridades, jornais colecionavam acontecimento. Muito cedo, as fotografias encontraram maneiras de viver juntas em álbuns, caixas de sapatos e arquivos. Mas a fotografia (ou cada fotógrafo, tanto faz) não resisitiu à tentação da obra-prima.Desde fins do século XIX e por boa parte do XX, testemunhamos o desmonte sistemático dos arquivos, das coleções e dos inventários. Tudo isso em nome da singularidade dos autores e do (devido) valor de suas imagens. Mas, a despeito do silenciamento da poética das séries fotográficas, apesar da vertigem do múltiplo e do pânico da banalidade, elas nunca foram completamente banidas da fotografia. Seguiram perturnando, desde o fundo de cada câmera escura, a paz luminosa das obras-primas.Hannah Arendt acreditava que cabia a cada geração - no seu agir e no seu pensar - preenher a lacuna entre o passado e o futuro, e assim conquistar o seu presente. Essa taefa, claro, nunca foi apenas do pensamento e da política, mas cabia igualmene à arte. Para nós, que vivemos depois dos modernismos, a missão parece demasiado árdua. Leandro Pimentelviu nas caixas-d'água do casal Becher esse gesto - aqui chamado de "tática" - que busca conquistar o presente por meio de um curto-circuito em que cada imagem cintila entre o passado e o futuro, livre da responsabilidade de ser a primeira ou a última.