As experiências negras de lutas por direitos, no século XX, são todas notáveis e dignasde admiração. Tratam-se de homens negros e mulheres negras que, na maioriadas vezes, podendo contar tão somente consigo mesmos, com suas associaçõesrecreativas, comunidades religiosas, organizações políticas entre outros projetos,fabularam dias melhores para si, para os seus e para a sociedade ampla, visandoconquistar e/ou ampliar direitos civis, sociais e políticos, tendo a luta antirracistacomo mote e a dignidade vital como ponto de partida. Graças àqueles sujeitos,organizados coletivamente, sobre os quais muitas vezes pouco ou nada sabemos,considerando a prática social do esquecimento racista que vigora no Brasil, chegamosaté aqui. A história da cidadania brasileira não pode ser contada corretamentesem as experiências sociais deles e delas que procuraram construí-la, ampliá-la emesmo ultrapassá-la, naquilo que ela ainda é insuficiente.Mas as formas históricas de luta são várias. Dentre elas, a arena da cultura foi um doslugares em que a população negra logrou ocupar espaço e, nela, conferir sentidosdistintos aos dos estereótipos racistas, classistas, sexistas que associam pessoas negrase pobres, à sua inferiorização. O trabalho de Viviane Narvaes recupera um dos capítulosmais importantes dessa história no século XX, a criação do Teatro do Sentenciado,por Abdias Nascimento. Condenado à revelia em 1941 e um encarcerado em1943, Abdias procura organizar na Penitenciária do Estado de SP sujeitos na mesmacondição que a sua, presos por crimes diversos, mas com enorme potencial paraenfrentar a sua própria condição humana, indo além do que as condições imediatasimpunham. Essa história insere o projeto de Nascimento em outros momentosnotáveis da história do teatro internacional e projetos com pessoas encarceradas.Mas também é um ponto de partida formidável para a história teatral brasileira: oTeatro do Sentenciado será o primeiro passo para criação, anos depois, do TeatroExperimental do Negro (RJ, TEN, 1944-1968) e do Teatro Experimental do Negro deSão Paulo (TENSP, 1945-1966), coordenados por Nascimento e Geraldo Camposde Oliveira, respectivamente. Sendo o mais conhecido o TEN, eles constroem umalinhagem da história do teatro negro no Brasil da metade do século XX, que permitechegar até as companhias teatrais negras de nosso tempo, mantenedoras de aspectossemelhantes dos projetos dos anos 1940: negros em cena, como personagens, comsua autoria, a