Os poucos anos em que freqüentou as reuniões sociais, Pascal - que era, segundo Elliot, "um homem do mundo entre os ascetas e um asceta entre os homens do mundo" - constatou que, na alma dos convivas, libertinos e ateus, o interesse por questões científicas e literárias estava aliado a uma total impenetrabilidade para o sentimento religioso. Decidiu dedicar à sua conversão, dali em diante, todo o labor de sua pena, e propôs-se a conceber uma apologia do cristianismo, não demonstrando as verdades da religião como se faz em geometria, de maneira abstrata, mas instalando-se no ponto de vista do homem natural, que pensa ser auto-suficiente. Esta é a origem dos Pensamentos, que não puderam afinal ser organizados numa obra perfeita e acabada, eque são, nas palavras de Sainte-Beuve, "uma torre cujas pedras foram colocadas umas sobre as outras, mas não cimentadas". Por isso, os muitos papéis que deixou têm uma história própria, de inúmeras e diferentes edições, que tentam interpretar como teria o gênio ordenado essas anotações de idéias ainda imaturas, pois, de fato, como diz Émile Boutroux, vemos os seus pensamentos nascendo diante de nós, e surpreendemos Pascal conversando consigo mesmo nas profundezas de sua consciência. Esta nova tradução brasileira traz, além de uma apresentação histórica e biográfica, os fragmentos numerados e as notas explicativas da clássica edição do filósofo Léon Brunschvicg - considerada definitiva e graças à qual acreditamos ter acessado, enfim, "todo Pascal e somente Pascal".