Álcool, Embriaguez e Contatos Culturais no Brasil Colonial (Séculos XVI - XVII)Este livro explora o contato entre os sistemas etílicos postos em cena nos séculos XVI e XVII.De um lado, o sistema indígena das cauinagens - a bebida-alimento fermentada à base da mandioca -, cujas características e significados culturais são analisados à exaustão. De outro lado, o sistema etílico do colonizador português - o do vinho, também alimento! -, cujas origens e significados na história ocidental o autor apresenta em minúcias.Em meio a descrições, inclusive técnicas, sobre o fabrico das bebidas e os cerimoniais acoplados ao consumo delas, João Fernandes enfrenta diversos tabus - de que o assunto, em si mesmo, está cheio. Por exemplo, destaca o papel crucial das mulheres no sistema do cauim, relativizando o lugar secundário que a etnologia dedicou à condição feminina no mundo tupinambá. Outro exemplo: as peculiariades de cada subsistema etílico europeu - o dos vinhos, o das cervejas e o dos destilados, tudo assim mesmo, no plural, porque, conforme a sociedade ou o tempo, o significado das bebidas variava, sem contar que o tipo de cada uma das bebidas jogava papel decisivo no campo das relações sociais e representações ligadas à embriaguez.Voltando ao período colonial, Fernandes nos mostra a vitalidade cultural do cauim, mesmo depois de iniciada a colonização, embora a cauinagem tenha sofrido ataques frontais - quiçá fatais - sobretudo dos missionários. É possível dizer que a cauinagem foi dos poucos elementos culturais indígenas (a exemplo da antropofagia) com os quais a colonização/missionação se recusou a negociar.O sistema português do vinho, por sua vez, foi mais longevo, apesar do clima abrasador do trópico, porém limitado ao enclave dos poucos reinóis que viviam na terra. O fato é que nem os portugueses tentaram impor o vinho aos índios, nem esses meteram seu cauim goela abaixo dos colonizadores. O contraste silencioso entre o cauim e o vinho permite alcançar, de um lado, a trajetória agonizante da sociedade tupinambá e, de outro, as inadaptabilidades do português ao desterro colonial - apesar do que disse Gilberto Freyre e conforme sublinhou, em contrário, Sérgio Buarque de Holanda - dois grandes mestres.Nessa luta do vinho com o cauim - que, na verdade, não chegou a ser bem uma luta. - quem saiu ganhando foi a aguardente de cana - a cachaça - bebida mestiça e colonial. Melhor dizendo: bebida colonial e escravista, pois a jeribita foi moed